terça-feira, 19 de maio de 2009

Os réus acusadores

Mil novecentos e noventa e oito encerrou com nuvens negras: o déficit gêmeo - cambial e fiscal -. excedeu os limites previstos no acordo com o FMI. Estagnaram-se as exportações e aumentou o desemprego. O Executivo, concentrando esforços na reeleição, foi tardio na propositura do ajuste fiscal. E o ritmo do Congresso parece-se mais com o "business as usual" do que com o frenesi das crises.

Mas há pelo menos três nuvens prateadas. Pela primeira vez o usuário pode entrar numa loja em São Paulo ou no Rio e sair com um telefone celular ativado, passando este de patrimônio cobiçado a instrumento corriqueiro. Inaugurou-se a primeira grande usina hidrelétrica construída em parceria com capitais privados, única esperança de evitarmos o racionamento, pois o Estado empresário sofre de leucemia investidora. Uma terceira notícia é que foram aprovadas as primeiras parcerias da Petrossauro com multinacionais e começarão em breve as licitações de novas concessões a consórcios privados.

Está terminando o ciclo dos monopólios estatais, de que resultou a cassação do direito individual de produzir e da opção dos consumidores. Rodovias esburacadas, ferrovias sucateadas, portos não competitivos, telecomunicações defasadas, eletricidade sob ameaça de racionamento, dependência de petróleo importado e pesada herança de petrodívidas - eis o balanço do Estado empresário e monopolista.

Começamos a auferir os "dividendos" da privatização. Lamento que ela tenha vindo lenta e tardia. No caso do petróleo, o momento é de superprodução mundial e de desconfiança dos capitais em relação aos mercados emergentes, mas há perspectivas de mobilização de capitais privados capazes de nos aproximar do fugidio objetivo do auto-abastecimento.

Nas telecomunicações, em que o adensamento do acesso proporcionará saltos de produtividade, escapamos por pouco de um fracasso. A janela ideal de oportunidade teria sido em 1996/1997, antes das privatizações européias e da crise asiática. A complexa estruturação privatista só se operacionalizou em 1998, às vésperas da crise russa, que teria paralisado o programa.

Credite-se ao Ministério das Comunicações e ao BNDES o mérito de conduzir a maior operação mundial da espécie, em meio à sabotagem corporativa e à guerrilha judicial, conseguindo quatro objetivos: recursos vultosos para o Tesouro, embate competitivo nacional e internacional, diversificação tecnológica e comprometimento das concessionárias com metas ambiciosas de penetração telefônica. Esses resultados são de tal forma positivos que empalidecem as acusações de manipulações burocráticas e impropriedades formais dos gestores do processo, tanto mais quanto não foi vitorioso o consórcio supostamente favorecido.

A história brasileira exibe uma injusta inversão de papéis. Assim, por exemplo, visionários foram chamados de "entreguistas", enquanto "idiotas" se autoproclamavam "patriotas". Nas telecomunicações, os verdadeiros réus não são os que cometeram ousadias para acelerar as privatizações e sim seus acusadores, os congressistas que votaram ou apoiaram os monopólios estatais.
A Constituição de 1988 ampliou o monopólio do petróleo e implantou o das telecomunicações. O primeiro desses votos foi a favor da dependência e do endividamento. O segundo, a favor da ineficiência e da baixa produtividade, pois que os cidadãos "excluídos" do acesso à telefonia (e portanto à internet) se tornam párias na "sociedade da informação".

Seria interessante se os milhões de prejudicados pelos anos de espera, ou os que tiveram de adquirir telefones a preços de mercado negro, movessem ações de perdas e danos contra os parlamentares monopolistas. Dever-se-ia criar no Congresso uma CPI para investigação de crimes contra o desenvolvimento econômico.

Num país carente de poupança, de modernização gerencial e de infusões tecnológicas, os promotores do estatismo praticam crimes contra o desenvolvimento. Alguns crimes, como o da política de informática, deveriam ser inafiançáveis.

Lembro-me neste começo de ano de duas receitas úteis. A primeira, de Tom Jobim, é que o Brasil "pare de admirar o que não deu certo". A segunda, é que o país deve de forma cristã perdoar os que erraram. Mas nunca premiá-los.

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